sábado, 9 de julho de 2016

O perigo de se assumir no Brasil

Tenho que publicar essa reportagem no meu blog, junto com as demais estatísticas da violência contra homossexuais, transexuais e transgêneros.  É claro que que outras minorias discriminadas também sofrem violência, É preciso lutar pelo respeito e pela igualdade. O amor é sempre a resposta certa.
Essa reportagem foi extrída da Revista EXAME., 05/07/2016 12:38

São Paulo – O Brasil vive hoje uma epidemia de violência contra homossexuais que transformou o país no lugar mais perigoso do mundo para lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros. Essa é a conclusão de reportagem do jornal americano New York Times publicada nesta terça-feira.
Citando dados do grupo Gay Bahia, a publicação afirma que mais de 1,6 mil pessoas foram assassinadas no Brasil por motivações homofóbicas nos últimos quatro anos e meio – o que representa praticamente uma morte por dia.
Para o jornal americano, esses números contrastam com a “imagem de uma sociedade tolerante e aberta” de um país que “aparentemente alimenta expressões de liberdade sexual durante o carnaval e que tem a maior parada gay do mundo”.
Essa reputação, diz a publicação, não é sem fundamento. “Nas quase três décadas desde que a democracia tomou o lugar da ditadura militar, o governo brasileiro introduziu diversas leis e políticas com o objetivo de melhorar a vida das minorias sexuais”, diz o texto.
A reportagem cita que o Brasil foi um dos primeiros países a oferecer medicamentos antirretrovirais para diagnosticados com HIV, foi pioneiro na América Latina a reconhecer a união civil de pessoas do mesmo sexo para fins de imigração e um dos precursores a liberar a adoção de crianças por casais homoafetivos.
O ponto, segundo a publicação, é que as tradições sociais de alguns grupos não caminharam no mesmo ritmo dos avanços obtidos no sistema normativo.
A reportagem relaciona a violência contra gays com a cultura machista que ainda perpetua na sociedade brasileira e com o crescimento de alas evangélicas mais conservadoras, que se opõem abertamente ao público LGBT
De acordo com o cientista político Javier Corrales, ouvido pela reportagem, os brasileiros até estariam mais tolerantes. O problema é que aqueles que se mantêm intolerantes estariam “desenvolvendo novas estratégias e um discurso mais virulento para barrar o progresso nessas questões”, afirmou. 
Tópicos: GaysPreconceitosLGBTViolência urbana

Diário, memórias e descobertas de garotas e garotos homosexuais: Todas as cores do mundo, o diáriode uma adolescent...

Diário, memórias e descobertas de garotas e garotos homosexuais: Todas as cores do mundo, o diáriode uma adolescent...: Todas as cores do mundo, o diário de uma adolescente lésbica Cap 1  a descoberta Já não é fácil ter 16 anos, morar na periferia de ...
Cap 3
 O armário  continua para sempre

Casei-me, felizmente com um homem muito gentil, e uma das melhores e mais compreensivas pessoas que conheci na vida. Com 1 ano de casada eu me abri com ele. Choramos e sofremos muito. Eu estava grávida.  Resolvemos continuar morando juntos.
Depois de algum tempo, conheci o verdadeiro amor da minha vida, Lúcia.

Vivo no armário até hoje, não achei um meio de contar aos meus pais e amigos, mas tenho a sensação que eles sabem, porque a Lucia mora comigo e o Ricardo. O Ricardo vive a vida dele e somos amigos. Um dia, quem sabe, eu tenha a coragem de enfrentar o mundo. Tudo está por enquanto em minha memória, e em um diário que mantenho escondido. 

Esse é o fim da Historia da Márcia, por enquanto.
Esperamos que um dia ela possa andar na rua de mãos dadas com a pessoa que ama, sem medo de ser julgada como aberração, ou que ao menos ela tenha a coragem de lutar por ela mesma, sem considerar a opinião dos outros. Porque amar não faz mal a ninguém.

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Capitulo 2     o armário é muito apertado

Conseguimos esconder muitas coisas de muita gente, e principalmente, escondemos muitos segredos de nós mesmos.
Mas o desejo físico é uma coisa difícil de esconder. Ele escapa do nosso corpo através de olhares, cruzar ou abrir de pernas, o andar, o modo como inclinamos a cabeça quando estamos interessados em alguém. Assim Wélida descobriu aos poucos meu segredo. Ela era inteligente e me confrontou umas cinco vezes. Eu sou um tantinho covarde, e fiquei acuada como um rato no canto da parede.
Eu amava aquela menina com todas as minhas vísceras. Mas ela jamais obteria uma confissão.  Meu plano era basicamente morrer. Morrer antes de decepcionar meus pais, a igreja e sofrer a vergonha de me assumir na escola. Já imagino meu rótulo, as pessoas comentando sobre mim: “sabe a Márcia, aquela sapatão que abandonou a Deus”?”, ou então: “ nossa, uma menina tão bonita e lésbica!” (como se a beleza feminina estivesse a serviço dos homens pra  mulheres poderem casar e procriar)
Nossa, minha cabeça estava cada vez pior. Ou melhor. Sei lá. Quem pode ria me ajudar?
Fui deixando o tempo passar , fui me acomodando, reprimindo o que eu achava que poderia ferir meus pais, minha família, meus amigos.
A Wélida, há muito já era passado. Interessei-me por muitas mulheres sem que ninguém percebesse. Eu estava com 22 anos, e  me formando em TI.
Havia aquela cobrança social sobre relacionamentos. Meus pais, principalmente viviam perguntando quando eu iria arrumar um namorado.
Eu não podia pensar apenas em mim, e fazer sofrer todos que me amavam, e que jamais entenderiam meus sentimentos. E pra ser sincera, eu mesma achava sujos os meus desejos. Quem foi criada sob os preceitos Cristãos, sabe que isso não é bíblico, não é coisa de Deus. Uma hora ou outra eu seria punida por meus pensamentos e sentimentos.
Melhor seria me dedicar ao trabalho.

E o tempo foi passando.....

quinta-feira, 7 de julho de 2016

Todas as cores do mundo, o diário de uma adolescente lésbica

Cap 1  a descoberta

Já não é fácil ter 16 anos, morar na periferia de uma grande cidade e ser pobre. Todos cobram responsabilidades de adulto, como trabalhar, manter a casa em ordem, ir à escola, tirar boas notas. Sem contar aquelas pequenas, porém significativas expectativas sociais, as quais todos temos que nos encaixar: andar na moda, ser magra, bonita. Sufocante. O mundo parece ameaçador pra quem nasce se encaixando em padrões convencionais, imagine pra quem nasceu diferente, gostando de namorar pessoas do mesmo sexo!
Meu nome é Márcia, todos me chamam de Ma.
Vou contar minha história pra que o mundo sinta um pouco o que sinto, chore e sorria comigo. E especialmente sinta o que é sofrer, apenas por aceitar ser quem você é. Ninguém nasce, cresce e um dia pensa: vou sofrer bullyng, andar na rua com medo,  ter que aprender logo cedo que o mundo é cruel com as diferenças.
Eu ia à igreja com minha mãe e meu pai. Éramos evangélicos. Sempre gostei de agradar meus pais. Gostava de ver o olhar de satisfação da minha mãe quando  via meu boletim, e ouvir os comentários da minha avó sobre como eu era uma boa e comportada menininha. Na igreja eu cantava e era bastante elogiada.
Com 10 anos, comecei a perceber que minhas amigas da escola falavam de meninos e ficavam interessadas. Eu não me interessava por nada. Apenas cumpria meus deveres escolares, passeava com minha mãe, com meus irmãos. Quando completei 13 anos, eu mesma comecei a me sentir diferente, pois enquanto minhas amigas se apaixonavam, davam seus primeiros beijos, eu nem sequer sentia uma pontadinha de interesse pelo universo masculino nesse sentido. Eu tinha amigos, gostava deles. Eu tinha um amigo em especial chamado Thiago. O Thiago não era alvo do interesse feminino, era “estranho”. Tinha um cabelo fedido e um chulé do cão. Andava com as calças que eu acho que tinham sido do bisavô dele. Era inteligente, jogava vídeo game e lia muito. Todo sábado eu ia pra casa dele pra fazer qualquer coisa, especialmente falar mal dos outros. Parece que éramos peças que estavam sobrando de um quebra cabeça qualquer. Era meu único e melhor amigo. Assistíamos 100 vezes ao  mesmo filme de comédia e ríamos todas as vezes.
Um dia a mãe dele entrou na sala  e disse: Thiago, olha o bolo de chocolate que eu fiz pra você e sua namorada.  Minha cara derreteu e caiu. Eu olhei pra ele que ficou vermelho feito uma pimenta e abaixou os olhos.  Meu Deus, será que éramos namorados? Será que aquilo era namorar? Será que eu teria que um dia inevitavelmente beijar na boca dele, senão não seriamos mais nada?  Mas eu não queria beijar o Thiago, e se ele gostasse de mim e ficasse para sempre magoado.
Porque eu não sentia interesse em beijar nenhum menino? Será que eu era lésbica?
Eu era apenas uma adolescente, e não tinha que ficar pensando nisso agora.

Que  absurdo um pensamento desses passar na minha cabeça, só podia ser algum espírito do mal assoprando bobagens no meu ouvido
Eu não queria perder meu amigo, e não queria namorar com ele. Resolvi conversar com ele, mas parece que ele ficou com vergonha de mim para sempre.
Eu  fiquei sozinha, acho que ele gostava de mim de maneira diferente.
O tempo passou e fui para o ensino médio. Conheci uma nova amiga e fiquei entusiasmada.  Wélida era divertida, simpática e muito diferente de mim. Fazia amizade com toda a escola. Ela era popular, linda mesmo, e diferente do meu querido amigo que me abandonou, tinha o cabelo cheiroso e não tinha chulé.
O melhor de tudo era que eu podia freqüentar a casa dela sem medo de sermos confundidas com um casal, afinal não éramos lésbicas, Deus me livre, o que era uma coisa totalmente fora de cogitação na minha vida. Eu lia a bíblia e sabia que essas coisas não de Deus.
Fazíamos muitas coisas juntas. Fazíamos as unhas, íamos ao cinema, dormíamos uma na casa da outra e ela frequentava a igreja também. A Wélida tocava guitarra e eu cantava. Eu arrumava o cabelo dela e lhe fazia a maquiagem.  Era perfeito.
Um dia, ela toda alegre  veio me contar que estava interessada por um garoto da escola. Falou por horas da beleza e simpatia do maldito indivíduo. Meu coração inexplicavelmente partiu em um milhão de pedacinhos e evaporou do meu peito. Minha cabeça ficou vazia, e tudo ao meu redor começou a perder o brilho, o cheiro, a graça.
Fui pra casa e não tinha ninguém pra conversar.  Na igreja sempre diziam que todos os nossos problemas podemos entregar nas mãos de Deus. Fui orar. Perguntei pra Deus o que era aquilo que eu estava sentindo, mas não obtive resposta.
Porque eu sofria tanto por causa de uma menina? Eu nunca ia contar esse segredo pra ninguém. Eu ia esperar passar e tinha a certeza que Deus iria me ajudar.
E se eu estivesse apaixonada por uma menina? Isso seria sinal de que sou uma adolescente lésbica? Seria uma fase? Eu já conhecia de cor todo o discurso da minha mãe se fosse contar ela: “Isso é coisa do Satanás, vamos contar pro seu pai, pro pastor e fazer uma corrente de oração aqui em casa. Ungiriam-me com óleo santo, e eu seria proibida de sair de casa. E o Pior de tudo, o mais arrasador seria se a Wélida soubesse. Nunca mais ela falaria comigo e eu certamente morreria.
Por que coisas ruins como essa acontecem com gente boa como eu? Não maltrato os animais, gosto de crianças, ajudo meus pais, sou estudiosa. Eu destruiria a vida de todos os que esperam que eu seja apenas mais uma garotinha normal.
Os nossos sentimentos, as vezes são como colares muito apertados, ou espartilhos 5 vezes menores que o nosso tamanho.
Minha amiga continuou indo à minha casa, mas eu já não era a mesma. Evitava contato visual, e não queria mais ir dormir em sua casa. Ela percebeu. Estranhamente nunca mais falou no maldito rapaz, e eu nem perguntei. Ela me olhava e perguntava a cada cinco minutos o que estava acontecendo.
Eu tive a brilhante idéia de pedir aos meus pais para me mandarem para um acampamento bíblico nas férias. Assim ficaria longe dela e me concentraria nas leis de Deus.
Passei uma droga de mês rodeada por garotas. De biquíni, de calcinha, de camisola.
Aquele parecia o acampamento do Satanás.
Definitivamente, eu era lésbica. Eu era a droga de uma adolescente lésbica e evangélica.
Esse diário, é o relato do inicio do pequeno inferno em que minha vida se transformou.
Hoje, adulta que sou, penso o quanto eu poderia ter evitado toda a angústia que passei, apenas lutando por mim mesma, aceitando que cada pessoa é responsável por sua alma, e que a principal pessoa no mundo que devemos zelar pela felicidade absoluta somos nós mesmos. Nossos pais, a igreja, a escola e a sociedade e as a maioria das religiões cumprem seu papel de fabricarem humanos iguais. O medo da diferença mata, literalmente